terça-feira, 27 de março de 2012

Vai brincar ou trabalhar?

Dias destes, estávamos eu e duas colegas chegando ao trabalho e pegando nossos materiais no armário, quando uma delas me perguntou: Nossa, quanto brinquedo! Você vai trabalhar ou brincar?

 
Achei muito inusitada a pergunta, mas ao olhar para minhas mãos, vi que realmente só havia um martelo e vários brinquedos. Respondi animada que brincar é meu trabalho.

Já conversamos algumas vezes no blog sobre a importância no brincar no desenvolvimento infantil. Durante a consulta médica, o brinquedo reduz a ansiedade da criança em passar no médico, faz um vínculo melhor com o profissional. Vários testes do exame neurológico realizo brincando com a criança e ela nem percebe que está sendo examinada.

Observo como a criança manipula o brinquedo, se tem contexto de brincadeira, se explora o ambiente adequadamente, se usa as duas mãos na brincadeira, se tem força para pegar o brinquedo, se faz movimentos de coordenação fina, enfim, brincar é parte fundamental da minha avaliação neurológica.

Acredito que o ambiente onde uma criança é examinada deva ser leve e bonito, assim como o lugar onde ela vive. Brinquedos coloridos, adequados para a idade, liberdade de movimentos, paciência e explicação de cada passo do exame é uma atitude de respeito ao paciente, neste caso, à criança.

Uma frase que detesto escutar é quando a mãe fala “se você não ficar quieto, ela vai te dar uma injeção!” Desminto na hora. Não dou injeção e medicar não pode seu usado como uma punição. O exame é necessário e vai ser realizado, explico o que vai ser feito e caso não haja colaboração, contemos fisicamente (família segura), mas não com ameaças ou punição, pois isso não funciona bem com criança, especialmente com as menores.

Examinar uma criança é um momento delicioso, de manter contato, criar confiança e conexão. Tornar essa ocasião, um momento de prazer é fundamental para construir uma boa relação terapêutica.   

Se é assim na consulta médica, imagine em casa? Por isso, sempre insisto na necessidade de brincar junto com a criança, estimular e participar de perto da vida de seu filho, tanto nas brincadeiras, quanto na escola. Esse é o melhor estímulo que qualquer criança pode ter.

Boa semana
Dra. Alessandra

terça-feira, 20 de março de 2012

Ser pai (ou mãe) é uma arte

Hoje presenciei uma cena que me comoveu. Especialmente porque foi um episódio de amor explícito vindo de um paciente e disponível pai.

Longe de mim, levantar qualquer bandeira ou generalizar situações, mas na minha vida clinica, a esmagadora maioria dos casos em que há uma criança com necessidades especiais, a cuidadora é a mãe, depois os avós e só depois, o pai.

Chega a ser frustrante, a quantidade de vezes que escuto a mesma história: Doutora, depois do diagnóstico, o pai foi embora e nem vem mais nos visitar. Já tem outra família.

Não acho que filho nenhum deva segurar um casamento onde não há mais amor ou cumplicidade. Mas não existe ex-filho. Essa é uma escolha para a vida toda e fingir que um filho não existe, em minha opinião, é uma falha de caráter.

Mas fato é que alguns pais são dedicados e amorosos e tenho também a situação inversa, em que a mãe abandona o filho e o pai assume toda a responsabilidade. Não é o mais frequente, mas como disse não estou aqui levantando nenhuma bandeira.

Voltando a história, estava no metrô em São Paulo, no começo da tarde, vagões vazios e a bela estação Sumaré, na linha verde, à nossa frente, quando ouvi uma voz mais alterada.

Era um jovem rapaz de seus 14 anos, com Síndrome de Down, que agitado não queria sair do metrô. Seu pai calmamente explicava que ele já era um rapazinho e que estava na hora de descer, pois ele tinha que trabalhar. A cada elevação de voz do garoto, o pai lhe fazia um carinho no rosto que arrancava um sorriso do menino. Mas não teve conversa. Chegou a estação e ele não desceu.

O pai continuou explicando, com firmeza e calma, evitando uma crise de birra, mas sem abrir mão da sua posição, até chegarmos à próxima estação, onde desci, junto com eles, que tomaram o trem para o outro lado já com o menino concordando em descer na estação certa.

Fiquei me perguntando, quantos de nós tem a disponibilidade emocional de andar uma estação a mais de metrô para não estressar um filho especial, sem brigar ou gritar com ele, só pontuando com firmeza?

Crianças com deficiência intelectual, autistas, entre outros se estressam quando saem de sua rotina ou quando estão em grandes aglomerações. Respeitar esse momento com amor e paciência é um exercício de paternidade que é raro se ver, mas quando presente aquece nossos corações.

Boa semana.
Dra. Alessandra

domingo, 11 de março de 2012

PRIORIDADES


Vi essa foto no facebook no mesmo dia que ouvi no rádio um orgulhoso representante do governo afirmar que entregaríamos um Maracanã moderníssimo no prazo previsto para a copa do mundo.

Sinceramente essa inversão de valores que observamos no mundo atual me incomoda. Posso parecer “careta” ou até antipática, mas sinceramente não me importo com o destino do Maracanã ou “Itaquerão” ou qualquer outro estádio.

Vivemos num país onde crianças morrem de fome e de doenças causadas por falta de educação e saneamento básico. Não consigo achar isso menos importante ou menos urgente do que o carnaval ou o futebol.

Parafraseio Renato Russo ao perguntar que país é esse, que dito em desenvolvimento paga salários miseráveis aos seus educadores e seus profissionais de saúde? Que paga verdadeiras fortunas aos seus políticos (fortunas quando comparados aos salários de nós, pobres mortais) que tão pouco fazem por nós?

Eu não tenho dúvidas que todos os estádios serão entregues, provavelmente às pressas, superfaturados e maravilhosos. Entretanto, tenho dúvidas se teremos algum dia hospitais públicos com atendimento digno às pessoas, escolas inclusivas e bem aparelhadas, com um número de alunos decente. Se, algum dia, teremos uma justiça realmente justa e para todos.

Essas são as minhas dúvidas. Quanto às obras dos estádios e do sambódromo, essas sempre são finalizadas, nem que seja à custa de leitos hospitalares. Mas quem se importa?

Pensemos nisso, especialmente na hora do voto, o que ainda parece ser a grande força que nos resta.

Um abraço.
Dra. Alessandra

Ansiedade na infância: por que nossas crianças sofrem com o amanhã?

Eu acho que a infância é, sem dúvidas, a melhor fase da vida. Onde tudo é lúdico e onde a vida ainda é mais diversão do que obrigação....